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Nos dois textos anteriores desta série, a intenção foi trazer outras lentes para repensarmos a gestão e a liderança. No primeiro, ao olhar para poder, raça, terra, corpo e tempo a partir de Cida Bento, Nego Bispo e Ailton Krenak, a liderança foi deslocada do campo da técnica individual para o campo das estruturas que sustentamos, conscientemente ou não. No segundo, ao entrar no pensamento filosófico africano com Hountondji, Fu-Kiau e Ivan Monteiro, o deslocamento foi ainda mais profundo: mexemos nas bases do que chamamos de saber, de conhecimento legítimo, de pensamento "válido". A liderança passou a ser entendida também como escolha de repertórios e, portanto, de mundos possíveis. Neste terceiro e último texto da série, o movimento é de aterrissagem. Saímos das grandes categorias e voltamos ao chão: território, pertencimento, palavra, ancestralidade e corpo coletivo. Voltamos para a pergunta que costuma ser evitada nas organizações: o que sustenta, de fato, um grupo de pessoas ao longo do tempo? Quilombo: liderança como sustentação da vida coletivaMulheres quilombolas: territórios de existências negras femininas, organizado por Selma Dealdina O livro, mediado por Selma Dealdina, nos obriga a revisitar uma palavra frequentemente esvaziada: quilombo. Aqui, quilombo não é apenas memória histórica nem metáfora de resistência. Quilombo é prática cotidiana de autonomia, é tecnologia social, é território vivo que se mantém mesmo quando tentam destruí-lo. Há algo profundamente relevante para a gestão contemporânea nessa definição: um quilombo não se sustenta por desempenho individual, meritocracia ou ranking. Ele se sustenta por coletividade, por vínculos, por transmissão de saberes, por responsabilidade compartilhada. As mulheres quilombolas aparecem como eixo dessa sustentação. São elas que cuidam do território, da memória, da alimentação, da política, da educação e das relações. Não por romantização, mas por necessidade histórica. Isso confronta diretamente o imaginário dominante de liderança nas empresas. Se olharmos com atenção, muitas organizações operam como o oposto de um quilombo:
O livro nos lembra que não há dissociação entre sujeito e objeto. Quem trabalha transforma o sistema e é transformado por ele. Não existe neutralidade. Algumas perguntas começam a emergir quando trazemos essa lente para a gestão:
O feminismo comunitário apresentado na obra amplia ainda mais esse debate. Ele não propõe um modelo único de luta, mas sim a troca de saberes, a proteção coletiva e a construção de possibilidades a partir das condições reais de cada mulher. Talvez uma das contribuições mais fortes desse livro para a liderança seja esta: sustentabilidade não é crescimento infinito, é continuidade da vida. Orí: a liderança que começa na cabeça que carregamosOrí: a cabeça como divindade do Márcio de Jagun Se o quilombo nos fala de território coletivo, Orí nos traz a um território íntimo, mas nunca individualista. Na cosmologia apresentada por Márcio de Jagun, Orí é a cabeça, a sede da consciência, da memória, da decisão e do destino. Não como abstração, mas como divindade que carregamos conosco. Orí guarda nosso passado, registra nossas escolhas e orienta nosso caminhar. Nada aqui é linear. Nada é separado em início, meio e fim. A vida é processo, atravessamento, repetição, retorno. Há algo profundamente contra-hegemônico nessa visão quando aplicada à liderança. Em vez de líderes que atribuem o sucesso ao acaso, à sorte ou a forças externas, Orí nos lembra da responsabilidade pelas escolhas. Submeter o destino apenas à vontade do que está fora (mercados, acionistas, modismos de gestão) é desprezar a própria capacidade de influir no futuro. Outro ponto central é o papel da palavra. A palavra conduz energia. Ela cria, fortalece, destrói. Não é neutra. Em contextos organizacionais, isso soa quase óbvio, mas raramente é tratado com a seriedade necessária. Feedbacks, discursos estratégicos, comunicados, rituais de alinhamento: tudo isso é palavra em ação. Perguntas incômodas começam a surgir:
A tradição oral apresentada no livro também nos ensina sobre o tempo e a maturidade. Saber não é despejado, é transmitido quando há prontidão para recebê-lo. Isso contrasta fortemente com modelos de gestão baseados na aceleração contínua, na sobrecarga cognitiva e em decisões apressadas. Orí nos lembra que o que se sabe é diferente do que se vivencia. E liderar exige lidar com essa diferença o tempo todo. Fechando a trilogiaAo longo destes três textos, a liderança foi sendo deslocada, camada por camada. Primeiro, do indivíduo para as estruturas que sustentam o poder e a exclusão. Depois, dos modelos mentais hegemônicos para outras formas de pensar, de saber e de conhecimento. Agora, do cargo e da técnica para o território, o pertencimento, a palavra e a consciência. Se há um fio que costura toda essa trilogia, ele não é um framework organizado em um manual de boas práticas. É uma pergunta: que tipo de mundo estamos ajudando a sustentar ao escolhermos como liderar? Quilombo nos lembra que ninguém sustenta nada sozinho. Orí nos lembra que toda escolha tem consequência. A palavra nos lembra que liderança também é energia em circulação. Talvez repensar gestão e liderança passe menos por buscar novas respostas e mais por sustentar novas perguntas. Perguntas que nos obriguem a olhar para o coletivo, para o território e para a cabeça que carregamos todos os dias. Encerramos aqui esta série. Mas as perguntas seguem caminhando, respeitando o que passou, dando novos sentidos ao que se apresenta no agora e nos estimulando a construir novos imaginários. Se alguma delas te atravessou, me conta respondendo a este e-mail. Te vejo nos dois mergulhos finais desta newsletter. |
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