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Na edição anterior, começamos a mexer na nossa prateleira mental de referências sobre liderança. Saímos da estante clássica dos livros de gestão do eixo EUA/Europa e nos aproximamos de autoras(es) que falam de poder, raça, terra, corpo e tempo: Cida Bento, Nego Bispo e Ailton Krenak. A provocação ali era simples: se não ampliarmos o repertório, continuaremos falando de liderança a partir de uma visão muito estreita de mundo. O propósito desta série de textos é justamente esse: alargar a nossa visão sobre liderança, modelos de colaboração, impacto e equipe, trazendo referências que quase nunca aparecem em livros de negócios, mas que falam diretamente sobre como vivemos, decidimos e nos organizamos. Nesta segunda parte, quero entrar em outro campo: o do pensamento filosófico africano. Não para "exotizar" essas referências, mas para reconhecer que, sem elas, seguimos presos a uma única forma de pensar o que é saber, o que é tempo, o que é comunidade e, por consequência, o que é liderar. Reaprender a pensar: quem define o que conta como saber?Sobre a filosofia africana: crítica da etnofilosofia do Paulin J. HountondjiHountondji faz um movimento que, à primeira vista, parece distante do cotidiano corporativo: ele critica a maneira como os europeus construíram a ideia de "filosofia africana" como se fosse uma coisa única, homogênea, quase folclórica. Quando ele desmonta a etnofilosofia, essa tendência de falar de "o africano" como um bloco revela o que acontece quando um grupo transforma seres humanos de carne em objetos de discussão abstratos. Não é muito diferente do que vemos em empresas que falam de "colaborador", "talento", "recursos humanos" sem olhar para a pluralidade real das pessoas que compõem o sistema. Há uma frase que me acompanha desde a leitura: "é preciso reaprender a pensar". Para mim, esse reaprender tem tudo a ver com liderança. Quem lidera e toma decisão com base apenas em um tipo de fonte, um tipo de teoria, um tipo de experiência, cai exatamente no risco que Hountondji aponta: confundir um recorte com o universal. Quando ele diz que "a filosofia é uma história, e não um sistema, um processo essencialmente aberto", está, em alguma medida, dando uma definição muito boa de liderança: não um conjunto fechado de receitas, mas um processo aberto, histórico, cheio de sobressaltos, disputas, revisões e aprendizado. No contexto de equipes e colaboração, Hountondji nos lembra que a tradição é sempre plural. Não existe "o jeito certo" da equipe ser ou “a cultura oficial”. Há um debate constante, ainda que silencioso, entre pessoas presas ao mesmo destino organizacional, tentando fazer com que esse destino seja o menos ruim possível. Ler Hountondji como gestor(a) é um exercício de humildade: é reconhecer que nossos modelos de gestão também são produtos históricos, situados, e que tratá-los como neutros é uma forma sofisticada de não pensar. Liderança como escuta e arquivo vivoO livro africano sem título do Bunseki Fu-KiauFu-Kiau nos apresenta a cosmologia Bantu-Kongo como quem abre um mapa que está fora das coordenadas habituais. Ele fala de Kalunga como força vital em movimento, de cada pessoa como um "pequeno Sol", dos mortos como presença contínua, e não como ausência. Um dos pontos que mais me marcou foi a ideia de que o conhecimento não está em nós, mas está fora de nós: somos arquivos vivos, máquinas de registrar e organizar informações que circulam no mundo. Traduzindo isso para a liderança: o conhecimento não é um ativo individual a ser acumulado. É algo que passa por nós e precisa circular. Organizações que tratam o saber como propriedade reforçam hierarquias estéreis. Organizações que tratam o saber como um fluxo fortalecem a colaboração. Há também uma frase que conversa diretamente com o campo de gestão: "líder tem ouvidos e não boca". Em um ambiente em que se espera da liderança respostas rápidas, apresentações constantes, presença performática, Fu-Kiau nos lembra que o gesto mais relevante pode ser escutar com cuidado antes de nomear qualquer coisa. Em uma retrospectiva, em encontros 1 a 1 com uma pessoa liderada, ou em uma reunião de alinhamento, o papel de quem lidera não é apenas "falar bem", mas também sustentar um espaço em que outras vozes possam se articular e circular. Quando ele critica o "aprendizado superficial" e alerta para o perigo de falar sobre culturas que não se conhece, dá um recado direto para quem ocupa posições de influência: é melhor demorar e estudar do que emitir diagnósticos precipitados que pioram as relações. Em termos de equipe, Fu-Kiau nos convida a repensar duas coisas:
Humanidade como processo e poder como cuidadoIntrodução ao pensamento filosófico africano do Ivan Luiz MonteiroIvan Monteiro organiza algo que, para mim, faltava na estante: uma introdução didática, mas não simplista, aos conceitos fundamentais do pensamento filosófico africano. Quando ele diferencia diáspora, negritude e pan-africanismo, está ajudando a construir um vocabulário para falarmos de povo negro para além de slogans ou datas comemorativas. Isso, por si só, já é relevante para qualquer liderança que queira tratar diversidade de forma séria. Mas o ponto que mais se conecta ao nosso tema é a filosofia Ubuntu. Ao descrever a humanidade como processo e não como resultado, Ivan desloca a liderança de uma identidade fixa ("eu sou líder") para um movimento contínuo de humanização junto com outras pessoas. Em Ubuntu, ninguém é alguém sozinho. Identidade e bem-estar estão intrinsecamente ligados ao coletivo. Em contexto de trabalho, isso implica questionar a lógica da "carreira heróica", dos "altos potenciais" vistos como indivíduos desconectados das redes que os sustentam. Algumas frases do livro fazem essa ponte de forma direta:
No dia a dia, isso poderia se traduzir em perguntas simples:
Há também um convite a repensar nossos sistemas de recompensa:
Fechando a conversa de hojeSe, no texto passado, o foco estava em deslocar a liderança de um lugar individual para um lugar estrutural, olhando para a raça, a terra, o corpo, o tempo, neste conteúdo, o movimento foi outro: mexer nas bases do que chamamos de pensamento. Hountondji questiona quem define o que conta como filosofia. Fu-Kiau rebaixa o ego de quem acha que "possui" conhecimento. Ivan Monteiro apresenta a humanidade como processo e o poder como cuidado. O fio que atravessa tudo isso, para mim, é simples de enunciar e complexo de viver: liderar é também escolher de quais saberes a gente se alimenta e que tipo de mundo esses saberes ajudam a sustentar. Quando trazemos essas referências para o universo de colaboração, impacto e equipes, algumas perguntas começam a aparecer com mais frequência:
E, para você, o que ressoou desta vez? Se algo te atravessou (uma frase, uma imagem, um incômodo), me conta respondendo a este e-mail. Nos vemos na jornada da semana que vem o/ |
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