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Raphael Donaire Albino

[Pensamento sistêmico] O mapa como corpo vivo das organizações


Nos últimos meses, em projetos de consultoria com diferentes empresas, tenho voltado a uma ideia que considero fundamental: antes de mudar um sistema, precisamos entender como ele sente, reage e se adapta.

Organizações não são máquinas com peças que substituímos.

Elas se comportam mais como organismos vivos, como sistemas compostos por órgãos (áreas), tecidos (equipes), células (pessoas) e uma rede de vasos que flui informação, energia e intenções.

Quando algo adoece, o sintoma aparece em um ponto, mas a causa, quase sempre, está em outro.

O que é um mapa de rotas e sensores?

O mapa de rotas e sensores é uma ferramenta que ajuda a enxergar o corpo organizacional.

Ele revela como os sinais (indicadores, rituais, decisões) circulam entre os diferentes níveis (estratégia, coordenação e operação) e onde a comunicação do sistema se interrompe.

Nível estratégico

"Onde estão o propósito e as intenções de longo prazo, o "cérebro" da organização. Aqui, a clareza da visão é essencial para que o corpo saiba para onde se mover.

Artefatos como 6-pagers, OKRs e mapas estratégicos funcionam como o córtex pré-frontal: interpretam o contexto e direcionam energia.

Nível de coordenação

É o "sistema nervoso". Ele conecta diferentes áreas, traduz a estratégia em decisões e equilibra tensões.

Uma governança que avalie o portfólio, fóruns de priorização e quadros de dependências revelam se a coordenação está saudável ou sobrecarregada.

Nível operacional

É onde o sistema executa, sente e aprende.

Quadros de trabalho, métricas de fluxo e cadências de entrega são como sensores táteis, ajudam a perceber dor, atrito, energia e ritmo.

Os componentes do mapa

Representação da estratégia

A clareza estratégica é o sistema nervoso central. Sem ela, cada célula age por conta própria, o que resulta em desperdício de energia e movimentos incoerentes.

Documentar a estratégia (OKRs, diretrizes, 6-pagers) é dar ao corpo uma linguagem comum para se orientar.

Itens de trabalho

São os glóbulos em movimento, carregando oxigênio (valor). Um excesso de trabalho em progresso (WIP) é como uma circulação congestionada: o fluxo desacelera, o tempo de resposta aumenta e o sistema perde vitalidade.

Observar lead time, throughput e tipo de trabalho é fundamental para entender onde a energia está se acumulando ou se dispersando.

Sensores

São os sentidos do sistema visão, audição, tato organizacional.

Eles se manifestam em indicadores, feedbacks, pesquisas de clima e mecanismos de monitoramento (ex: sistemas de alertas).

Na minha experiência, as organizações até possuem sensores, porém estão tão anestasiadas e quando o sistema para de sentir, para também de aprender.

Rituais

São os batimentos cardíacos da organização. Reuniões de alinhamento, revisões, retrospectivas e fóruns de decisão mantêm o sangue circulando.

Quando cadências desaparecem, o corpo entra em arritmia: decisões se acumulam, conflitos se proliferam e o aprendizado se estagna.

Um exemplo prático

Em uma organização com rápido crescimento, a área de pessoas enfrentava um desafio típico: muitas iniciativas, baixa integração e pouco aprendizado coletivo (conto um pouco mais sobre este caso neste corte do curso sobre o Dynamic Flow na Software Zen).

Ao aplicar o mapa, percebemos que:

  • No nível estratégico, havia excesso de objetivos, sem clareza de prioridade.
  • No nível de coordenação, as dependências entre times eram invisíveis; uma equipe não sabia o que a outra estava entregando.
  • No nível operacional, a quantidade de trabalho estava alta, e a capacidade de entrega variava semana a semana.

"O sistema estava com “pressão alta": muito esforço, pouco aprendizado. Como eu costumo dizer, as pessoas estavam correndo errado.

A intervenção foi simples, mas profunda:

  • Reduzir o número de iniciativas simultâneas;
  • Criar rituais quinzenais de coordenação;
  • Tornar o trabalho visível com quadros e métricas de fluxo;
  • Revisar a forma de desdobrar a estratégia.

Em poucos meses, a "respiração" da área mudou. As equipes começaram a sincronizar, o tempo de entrega caiu e as decisões voltaram a ter contexto.

O corpo voltou a se autorregular.

Por que esse olhar importa

Donella Meadows dizia que "é quase irresistível culpar algo ou alguém", mas o verdadeiro poder está em aprender a ver o sistema.

O mapa de rotas e sensores é um convite para capturar o invisível: os sinais que o sistema emite antes de adoecer.

Quando o corpo organizacional sente, se adapta e aprende, a transformação deixa de ser uma intervenção externa e se torna um processo natural de regeneração.

Para fechar

Em vez de tentar consertar partes isoladas, talvez devêssemos perguntar: como está a saúde do nosso sistema?

O mapa de rotas e sensores não é um diagnóstico. É uma representação visual e, como todo instrumento que faz uma simplificação da realidade, possui suas limitações.

Porém, ele nos ajuda a perceber onde o sangue corre livre e onde ele ainda precisa de oxigênio.

Te vejo no próximo mergulho o/

Raphael Donaire Albino

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